Do que precisamos ser curados e libertados? A resposta
podemos encontrar no próprio sentido da paixão, morte e ressurreição de Cristo.
Se não precisássemos ser libertados e curados Jesus não teria passado tudo que
passou para nos salvar e não teria enviado o Espírito Santo para nos auxiliar
em nosso processo de santificação.
A primeira cura e por conseqüência, a primeira
libertação acontece quando nos livramos do pecado e de sua ressonância em nossa
vida. O maior problema do pecado é o nosso isolamento de Deus, quebra de
comunicação, e a desconfiança de que Ele possa nos perdoar e aceitar novamente.
A nossa oração e todo o nosso empenho deve ser
aplicado no reconhecimento do amor que Deus tem por nós. O ser humano é uma
bomba que quer se sentir amado e amar. Quando fomos amados na nossa infância,
na adolescência, na juventude, na fase adulta, enfim, se estamos nos sentindo
amados neste momento, estamos em processo de cura e libertação.
A nossa vida é um grande mistério, todos temos altos
e baixos, momentos de profunda alegria e de profunda decepção. Muitas vezes nos
colocamos no centro do mundo, somos egoístas e auto-suficientes pensando que
somos uma fábrica de realização pessoal. O pecado nos faz fortes, nos estampa
uma alegria superficial que é capaz de convencer aos outros e a nós mesmos.
O Espírito Santo vem até nós para abrir o verdadeiro
horizonte de nossa vida. Jesus nos diz que iremos conhecer a verdade e a
verdade nos libertará (Jo 08, 32). Esta libertação é um processo. Inicia nos
aspectos morais de nossa vida até chegar no íntimo de nosso ser, quando nos
sentimos moradas de Deus.
Quando olhamos para Jesus com o olhar do filho
pródigo (Lc 15, 11ss), estamos abrindo um grande espaço em nosso interior para
sermos curados. Quando Jesus curava os doentes olhava para eles especialmente
para a abertura ao amor pela Fé. Jesus curava independente da lei judaica, pois
para ele era mais importante a salvação da pessoa que um simples cumprir
aparente (Lc 14, 01-07). Toda a mensagem de Jesus se relaciona com a cura do
egoísmo. Do pensamento que o mundo gira em torno de nosso eu.
A Fé é capaz de nos curar e de curar os nossos
irmãos. Todos somos consagrados a Deus pelo nosso batismo, todos nós exercemos
o sacerdócio comum dos fiéis. O cristianismo é bonito pelo seu altruísmo. Somos
parte da comunidade daqueles que crêem em Deus Trindade. Não podemos entender
Deus sem utilizarmos o verbo sair. Deus saiu de si mesmo para nos criar com a
finalidade de participarmos de sua felicidade. Só seremos felizes quando
fizermos os outros felizes. Rezar pelos outros também é um método para nos
livrarmos de nossas fraquezas e limitações.
Hoje percebemos muitos “cadáveres ambulantes”,
pessoas que não sabem sua origem e nem seu fim. Não sabem quem as criou e para
o que foram criados. As relações comerciais estão acima das relações humanas
deteriorando profundamente o sentido da vida humana. Quando nos perguntamos o
que somos e para onde vamos não nos conformamos com o consumismo que nos
consome.
Somos cristãos (portadores de Cristo pela nossa
vida), dentro de um mundo descristianizado. As vezes podemos até participar
ativamente da Igreja, mas estamos longe de viver os valores daquele que é o
centro de nossa Fé. Só o amor poderá construir algo em nossa vida. Podemos
perceber na recuperação dos dependentes e dos detentos, que a mensagem que eles
necessitam é a realidade de que embora tenham cometidos muitas coisas más,
ainda são amados por Deus. Nós até poderemos fazer uma tentativa de esquecer o
nosso Criador, mas Ele é incapaz de passar um momento sem se lembrar de nós.
Todas as nossas dificuldades, do passado, do presente e do futuro devemos
“entregar” a Deus. Elas não nos pertencem, estão fora de nós e poderão até
servir para a nossa verdadeira realização. Devemos transformar os limões de
nossa existência em limonada.
Quando olhamos para os mártires, vemos ao lado de
suas figuras ou imagens o instrumento em que foram torturados. Eles abraçam
estes instrumentos tão terríveis de uma forma tão afável e carinhosa que nos
impressiona. Acredito que devemos olhar para a nossa história da mesma forma,
os instrumentos de tortura que podem ser os aspectos negativos de nossa
existência, devem ser vistos de uma outra forma. Um dia estaremos todos na
eternidade e iremos rir de nossas limitações e ver que muitas vezes valorizamos
em nossa vida aquilo que não tinha tanto valor e deixamos de lado o essencial.
Não podemos nos ancorar em nosso passado. Tudo
passa, só Deus basta nos diz Santa Teresa por que ficarmos ancorados nas
sombras de nossa vida sem vermos o sol do amor que Deus sente por nós?
Diante de Jesus vivo em nossa vida seremos curados.
Vamos perceber tudo que nos passou de uma forma diferente. O amor irá absorver
todas as nossas limitações. Se estamos amando o Amor nos transforma, buscamos
mesmo na noite o essencial e somos transformados por ele.
O olhar para dentro de nós mesmos é essencial para
sermos curados. Os dois verbos entrar e sair são fundamentais. Entramos dentro
para sairmos para fora. O cristão se realiza no altruísmo e não no egoísmo.
Quando descobrimos que a nossa existência é importante
para Deus e para os nossos irmãos nos comprometemos com a realidade. Isto
podemos perceber na vida dos grandes personagens do Antigo Testamento. Moisés
se compromete com o povo ao ver um judeu ser mal tratado. A compaixão fez com
que ele perdesse a honra do Egito para ser um libertador do povo de Israel. A
solidariedade nos impulsiona a fazermos o bem e até mesmo nos faz esquecer de
nossas limitações. Moisés percebeu desde o início que era profundamente
limitado para libertar o povo mas a missão o arrastou a fazer o bem. Elias tem
uma profunda contemplação de Deus e não é por isto que não se sente limitado,
pede até para morrer diante das dificuldades.
Jesus está presente na Eucaristia, ele quer nos
olhar desde dentro, das nossas dificuldades. Quando nos colocamos na presença
de Jesus Sacramentado a nossa vida é transformada. A troca de olhares é
fundamental, precisamos nos abrir a momentos importantes de adoração em nossa
vida. A reforma de toda a realidade, da nossa vocação, de todo nosso trabalho começa
quando nos colocamos diante de Jesus.
Só o amor pode nos curar. Sabemos de fatos concretos
de pessoas que se curaram após se sentirem amadas. Crianças deficientes que mal
sabiam falar e após uma adoção com muito afeto se transformaram. Nós não sabemos
amar, confundimos amor com sexo ou exploração da pessoa do outro. O mundo
materialista procura materializar os nossos corações. Quando nos materializamos
nos afastamos da realidade última de nossa vida, nos afastamos do Eterno.
Quando acontece um acidente não nos importamos com
nosso braço quebrado se temos que socorrer alguém que está muito mal em nosso
lado. Quando colocamos o nosso olhar no Eterno somos capazes de vencer nossa
limitação para vermos o essencial.
A oração é o caminho mais seguro para sermos o que o
Senhor quer de nós. Quando nos comunicamos com Ele nossa vida muda e vamos
entendendo com misericórdia as limitações de nossos irmãos.
Padre Giribone - OMIVICAPE
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